Por Sérgio Canuto, Felipe Galvão Abreu e Vitor Barion de Pádua
As lesões da rampa meniscal estão comumente associadas às rupturas do ligamento cruzado anterior (LCA). São caracterizadas por uma ruptura das conexões periféricas meniscocapsulares do corno posterior do menisco medial, aumentando significativamente a instabilidade anteroposterior e rotatória do joelho, quando comparada com lesões isoladas do LCA. Estudadas inicialmente por Hamberg, o termo “lesão da rampa” foi atribuído pela primeira vez por Michael Strobel, em 1988, diferenciando essa morfologia particular de lesão de outros tipos de fissuras longitudinais do corno posterior do menisco. Em 1991 Craig Morgan publicou uma nota técnica no Journal of arthroscopy de reparo por vídeo da lesão em rampa semelhante a técnica realizada atualmente usando o portal póstero medial
Embora exista uma longa história de reconhecimento das lesões da rampa meniscal na literatura, o tema tem sido pouco estudado nas últimas décadas, até um recente ressurgimento de interesse. Essa falta de importância prévia atribuída ao tópico é, provavelmente, consequência de fatores como a baixa sensibilidade da ressonância magnética, com um alto número de falso-negativos, insuficiente conhecimento sobre suas consequências biomecânicas, e um senso intuitivo de que essas lesões podem se curar espontaneamente. Além disso, a lesão está localizada em um “ponto cego” do compartimento posteromedial do joelho, o que dificulta sua visualização pelos portais artroscópicos convencionais, exigindo do cirurgião uma habilidade técnica mais apurada para seu acesso e reparo.
A literatura internacional mostra uma incidência das lesões da rampa entre 9% e 24% das reconstruções do LCA (RLCA), na população brasileira tem um estudo nosso, que será publicado esse ano na RBO, essa estudo teve uma prevalência média de 10,6% ( Autores: Felipe Abreu, Sérgio Canuto e Vitor Pádua)
No nosso estudo foi conduzida uma análise retrospectiva dos dados de 824 cirurgias todos os pacientes submetidos à reconstrução primária ou revisão do LCA, entre julho de 2014 e abril de 2020. A incidência das lesões da rampa meniscal em nosso estudo foi de 10,6% nas cirurgias de reconstrução do LCA. A incidência anual no período estudado, variando de 4,0%, em 2014, a 20,6%, em 2019, chama a atenção, e demonstra a significativa curva de aprendizado no diagnóstico e no tratamento dessas lesões.
TÉCNICA
Inicialmente, foi realizada a exploração artroscópica dos compartimentos femoropatelar, lateral e medial do joelho. A estabilidade do menisco medial foi testada com uso de um probe. Nos casos em que houve qualquer sinal de instabilidade meniscal, como aumento do deslocamento anterior do mesmo sob tração, ou quando visualizou-se a presença de alguma fissura em seu folheto inferior, foi realizada uma investigação no compartimento posteromedial, como proposto por Bertrand Sonnery-Cottet. Para a avaliação do compartimento posteromedial do joelho, o artroscópio é mantido no portal anterolateral, e inserido através de um espaço no intercôndilo definido pelo côndilo femoral medial, ligamento cruzado posterior (LCP) e tíbia . Nesse ponto, sugere-se uma manobra em valgo, durante a inserção do artroscópio, criando uma abertura maior do espaço no intercôndilo, e facilitando a passagem da câmera para o compartimento posteromedial.
Para uma melhor exposição do corno posterior do menisco medial, aplica-se a rotação interna máxima da tíbia, o que gera uma posteriorização do côndilo tibial medial, facilitando a visualização do menisco. Todo o procedimento foi realizado com uso de um artroscópio de 30o. Nos casos em que se constata alguma fissura do menisco (lesão da rampa), o reparo é realizado. Quando há, uma suspeita da presença de uma lesão de rampa oculta (Tipo D), a integridade meniscal foi testada com uma agulha, e em seguida com um probe, inseridos através de um portal posteromedial. A confecção do portal posteromedial é feita com o joelho em 90o de flexão. O uso da transiluminação auxiliou na visualização de veias a nervos que devem ser preservados. Uma agulha foi introduzida na direção da lesão, logo acima dos tendões flexores e 1 cm posterior à linha articular femorotibial medial. Em seguida, a incisão foi realizada com um bisturi de lâmina nº 11 sob visão direta artroscópica.
Um portal posteromedial único é suficiente, geralmente não há necessidade do uso de cânula. A lâmina de shaver foi, então, inserida através do portal posteromedial e ambas superfícies da lesão foram cruentizadas.
Para a realização das suturas foi utilizado um gancho de sutura de 25o (SutureLasso, Arthrex, Naples, FL, EUA), para a esquerda nos joelhos direito, e para a direita nos joelhos esquerdo, carregado com um fio de monofilamento absorvível nº 1 (PDS; Ethicon). O gancho de sutura foi manipulado pelos cirurgiões de maneira que a ponta afiada penetrasse no fragmento periférico da lesão com a parte capsular, de superior para inferior, em toda sua espessura. Em seguida, o gancho de sutura é passado da mesma forma, através da parte central do menisco medial, de inferior para superior. A extremidade livre do fio foi, então, pega com uma pinça artroscópica e recolhida pelo portal posteromedial. A confecção dos pontos, com nós deslizantes, foi realizada com o auxílio de um empurrador de nós. O reparo satisfatório e estável foi confirmado por avaliação com uso do probe, inserido e visualizado pelos portais anteriores e posteromedial. Por fim, o procedimento de Reconstrução do LCA é realizado com a confecção de túneis anatômicos independentes.
A- Acesso póstero medial com o gancho para suturar a capsula póstero medial
B- Passado gancho pela capsula póstero medial
C- Em seguida passando o gancho pelo menisco medial usando fio de PDS
D- Dado os pontos no PDS numero 1 pelo portal póstero medial